POSFÁCIO

 


UM RIO QUE LEVA E QUE TRAZ

No fim de 2009, enquanto eu escrevia este livro, o Clic! foi visitado pela fiscalização da prefeitura, que lhe informou que seu alvará de funcionamento não servia mais. Ao providenciar o novo alvará, Dri e Letícia tiveram uma surpresa desagradável: a regulamentação municipal tinha mudado e o único enquadramento possível para o Clic! era como escola.

Escola – ou “escolinha”, como se costuma denominar a instituição que atende a crianças com até seis anos – nunca foi o projeto do Clic!, desde sua idealização, pela fundadora Claudia Souza, em 1994. Dri e Letícia tiveram, no entanto, de decidir entre transformar o Clic! em escola ou fechá-lo, e resolveram lutar pela continuidade do trabalho no qual acreditam. Trataram, então, de conhecer as providências exigidas para que o Clic! funcionasse como escola.

Tiveram uma nova surpresa – desta vez boa: as diretrizes municipais para a educação pré-escolar estabelecem exatamente o que o Clic! faz há tanto tempo e com tanto conhecimento. Seria possível atender às exigências legais e ao mesmo tempo dar prosseguimento ao trabalho no qual acreditam. Teriam de se adaptar à burocracia, atender a exigências do Corpo de Bombeiros e do Sindicato dos Professores, precisariam reduzir o número de estagiários, sempre tão importantes para a formação do pessoal do Clic!, talvez até alterar seu calendário; os custos de funcionamento certamente subiriam, mas a essência do Clic! não precisava mudar, e isso animou as educadoras.

Nesse processo de mudança, iniciado em 2010, a Secretaria Municipal de Educação mostrou-se parceira do Clic!, facilitando a transição. “Isso foi muito confortador”, conta Letícia. “A funcionária que nos atendeu disse que já conhecia o Clic! e que o Clic! é o ideal de educação infantil para a Secretaria.” O mesmo apoio elas encontraram nos educadores, em geral psicólogos, que se dispuseram a voltar para a faculdade e fazer curso de pedagogia, uma exigência da legislação, inclusive para as coordenadoras.

A partir de 2010, o Clic! começou a se transformar em escola, mas continuou sendo o Clic! de sempre, dedicado a educar de acordo com a cultura da criança. No meio dessa transformação, outra novidade surgiu, em 2011. O marido da Dri recebeu proposta profissional para voltar ao México, sua pátria. A mudança seria boa para a família, disso ela tinha certeza; o que não sabia era o que isso representaria para ela e para o Clic!

Dividida e apegada ao trabalho, durante alguns dias, Dri frequentou o Clic! guardando segredo sobre o assunto, observando as crianças, as educadoras, enfim, o funcionamento da casa. “Tentava imaginar o Clic! sem mim”, conta. Constatou que tudo que ela tinha plantado estava florescendo: as educadoras, superintegradas, trabalhando com autonomia; Letícia, animada. Pensou: “Olha que hora boa para eu sair. O projeto não vai se desviar, o Clic! está em ótimas mãos”.

Com essa segurança, ela comunicou à Letícia sua saída e acalmou o susto da amiga: “Pode confiar, tudo vai dar certo”, disse. Assim como já fizera Claudia cinco anos antes, Dri decidiu deixar a sociedade, e como tinha acontecido com ela, Letícia também não quis ficar sozinha. Juntas, pensaram em quem passaria a trabalhar com Letícia. “Queríamos alguém que tivesse o Clic! no coração”, explica Letícia. Concluíram que a pessoa mais indicada seria Carol Brasil. “Ela tem tudo a ver com o Clic!”, diz Dri.

Ex-estagiária, ex-educadora, Carol também quis fundar um Clic!, quando saiu, em 2008, para ganhar seus filhos gêmeos, Henrique e Augusto. Não chegou a realizar seu desejo, mas ele permaneceu. Voltou em 2009 e substituiu a ex-coordenadora Luciana Borges, que recebeu outra proposta profissional irrecusável. “No Clic! é assim, sempre que a gente precisa muito de uma coisa, ela acontece”, diz Letícia, repetindo Claudia.

Ela ressalta que, em 2011, o Clic! vive o auge do alinhamento entre a prática e as teorias que lhe servem de referência. Nunca se estudou tanto, nunca se produziu tanto, nunca o Clic! investiu tanto nos educadores. Os grupos de estudo estão gerando inúmeros artigos, que serão publicados. Do México, Dri manterá contato com o Clic! gerenciando seu blog. Outra ideia em gestação é a organização de um congresso sobre criança e educação. “Como diz a Dri: ‘Quem rege o projeto é a equipe’. Este é o período da equipe”, observa Letícia. “E a nova sócia veio da equipe.”


Carolina Brasil Rehfeld Lopes nasceu em Belo Horizonte no dia 26 de outubro de 1983. É psicóloga, formada pela Fumec em 2007, e estuda pedagogia. Em junho de 2003 entrou no Clic! como estagiária do Grupo 3, que não existe mais. Nos anos seguintes passou por todas as turmas. Em 2005 substituiu a coordenadora, quando esta saiu. Permaneceu até 2008, quando seus filhos nasceram. Em 2009, retornou, trazendo os gêmeos; trabalhou um semestre como educadora do Maternal 3 e em 2010 como educadora do Grupo 2, quando voltou também à coordenação. Carol Brasil passou grande parte da infância na Serra do Cipó, subindo em árvores, cuidando de criações de patos, coelhos, porcos, jogando bente altas, almoçando de marmita com o pessoal das fazendas do avô e do pai. Nas férias da escola e nos fins de semana, estava sempre na roça; no resto do ano, brincava com o irmão, os primos e os colegas de um conjunto de edifícios no Bairro Luxemburgo, onde morou, e que até um clube possuía. Quando Letícia a convidou para sócia do Clic!, não pensou duas vezes. “A gente enraíza no Clic!”, diz.

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